O silêncio, mandar em si mesma, fazer seu próprio horário e ter tranquilidade sem a pressão da vida na cidade são alguns dos motivos que fazem com que Eliete Richartz Kuhn, 55 anos, afirme que nunca deixaria de ser agricultora. “Mas é serviço puxado”, confessa. Ela é apenas uma das muitas mulheres agricultoras que garantem nosso alimento.
Eliete acorda às 4 da manhã para começar os trabalhos na roça juntamente com seu marido, e algumas vezes ficam até a meia noite mexendo na estufa com cebolinha, salsinha, rúcula e couve, localizada no município de Antônio Carlos, Santa Catarina, onde ela nasceu.
Do outro lado do país, no estado do Pará, a rotina de Edvalda Menezes Maia, 52 anos, é um pouco diferente. Ela acorda cedo e deixa a casa toda em ordem, e só depois do almoço começa a produção de beiju e outros produtos feitos da mandioca, como tapioca, pães e bolos. Sua casa de farinha em Santarém, onde trabalha com o marido e filhos, já funciona há 35 anos. “Tudo o que tenho vem desse trabalho”, fala.
Os produtos de Edvalda são vendidos todos os finais de semana na feira do produtor de Santarém, mas também vão para outras cidades do norte do Brasil, como Belém e Manaus, e para mais longe, como São Paulo. Os “verdinhos” de Eliete, como ela mesma gosta de chamar, são vendidos para atravessadores que revendem para grandes redes de supermercado na região da grande Florianópolis.
A realidade das duas entra nas estatísticas do Censo Agropecuário do Brasil de 2017, onde 19% dos estabelecimentos agropecuários do país são administrados por mulheres, sendo a maior parte entre 45 e 64 anos de idade, somando um total de quase 416 mil mulheres. Já aquelas que trabalham em parceria com os maridos somam 23,2%, o que nos mostra que a mulher está presente em 42,2% dos estabelecimentos rurais brasileiros que produzem comida.
Quando, em São Paulo, comemos aquela tapioca no café da manhã, que na maioria das vezes não sabemos de onde vem, não imaginamos que passa pelas mãos de uma mulher como Edvalda, que aprendeu a processar a mandioca assistindo aos outros fazerem, e que hoje é o que mantém toda a família.
A mesma coisa acontece com os temperos verdes que deixam nossos pratos mais coloridos e saborosos. Quando pegamos um pacote de temperos já cortados na gôndola do supermercado, não temos a mínima ideia de que por trás dele existe uma mulher como Eliete, que vive com a renda desse trabalho juntamente a seu marido e a um parente que está em coma vegetativo há mais de 10 anos.
Histórias similares a delas, se contadas em números, chegam a milhões em todo o território brasileiro. ‘Milhões’ que nos alimentam e não conhecemos seus rostos, nomes, vozes, sorrisos, rotinas, dores e sonhos, mas que continuam levantando cedo e trabalhando diariamente para garantir o sustento das suas famílias e das nossas.