Fotografia é a reprodução de algo, de uma cena. Ela tem o poder de eternizar momentos. Através de uma boa fotografia de comida, conseguimos sentir a textura, o aroma e até o sabor daquele prato registrado. Conseguimos nos transportar para aquela mesa, relembrar lugares e pessoas queridas. Acompanhada de uma receita, desejamos até mesmo reproduzir aquele prato, convidar os amigos ou reunir a família. São os cinco sentidos do nosso corpo, ativados por uma só imagem. A fotografia imortaliza o que comemos.
Comida e memória andam completamente juntas. Quando me lembro de minha avó, me lembro dos pães caseiros, da lasanha, da pizza de frigideira. Me lembro da mesa cheia e reuniões de família com conversas intermináveis. Comida é carinho, é aconchego, é atenção. É uma gostosa lembrança da vida, o gosto da infância. E a tecnologia da fotografia nos possibilita registrar todos esses momentos especiais.
A fotografia ainda pode contar uma história. Chamamos de “storytelling”, que é justamente a arte de contar histórias através de um texto, de um livro, de uma fotografia, ou seja, de alguma arte em que uma história pode ser encaixada. É uma expressão relativamente recente na fotografia de comida, mas que está cada vez mais sendo estudada e aplicada pelos fotógrafos e “food stylists”. É sobre contar uma história através das imagens. É sobre produzir movimento, vida e sentimento em uma imagem ou pelo conjunto delas.
Na fotografia de comida, existe uma série de componentes que são essenciais para uma história se formar. As cores, o fundo fotográfico, as louças, os objetos, as roupas. A escolha de cada item e a composição de todos juntos formam um cenário e contam uma história que nos levam a imaginar dentro daquela cena. Por meio das fotografias abaixo, ilustro alguns exemplos:
Foto 1: Fim de tarde/início de noite em uma casa rústica, podendo ser uma casa da cidade ou até mesmo de uma fazenda. Uma mesa de jantar posta, aguardando o jantar ficar pronto. Utilizei como mesa um fundo de madeira de demolição. Também utilizei uma cadeira modelo antigo para intensificar uma cena de um ambiente de época. As flores, além de frescor e naturalidade, dão um aconchego ao ambiente. As frutas e legumes colorem a mesa, fazem conexão com a cozinha, e também podem ser um indicativo do tipo e sabor da receita a ser servida.
Foto 2: Uma mesa posta para um café da tarde de inverno. Uma mesa posta para quatro pessoas, podem ser família ou amigos. Novamente as flores trazem naturalidade e delicadeza. A toalhinha de crochê (aparece timidamente à esquerda) indica também delicadeza e pode também nos fazer lembrar de momentos com nossas avós/mães/tias. A roupa ajuda a afirmar a estação do ano: inverno.
Foto 3: Um cenário de fim de festa. A vela se apaga, os pratos estão sujos da comida principal. A sobremesa já foi servida! A toalha está suja de vinho e de doce.
Foto 4: Uma mesa repleta de picolés cremosos e refrescantes. As muitas flores, as cores e a luz clara podem indicar uma manhã linda de primavera.
Foto 5: Registro da preparação de um ravióli de cogumelos. A massa crua e farinha sobre a bancada indicam pré-preparo da receita. Utilizei um fundo imitando mármore para simular uma bancada de pedra para abrir a massa.
A iluminação também é de extrema importância no contexto todo, pois ela nos mostra se é dia, noite ou fim de tarde; café da manhã, almoço, café da tarde ou jantar; primavera, verão, outono ou inverno. Fotografar com a luz natural carrega essa complexidade e beleza toda. O fotógrafo que usa a luz natural como fonte de iluminação observa o melhor horário para contar a sua história. A sombra do outono na mesa do bolo em um café da tarde, ou aquela fresta de luz do meio-dia de um inverno rigoroso iluminando uma massa ao molho de tomates, ou até mesmo a luz quente do verão na mesa de refrescos. As histórias podem ser infinitas e, quanto mais próximas da realidade, melhor. Isso porque, para haver apreciação e emoção, o público precisa se identificar e reconhecer cenas como parte também de seu cotidiano ou de uma lembrança muito feliz de sua vida!
As histórias contadas através da fotografia vêm sendo, cada vez mais, exploradas pelas marcas. Aquela fotografia puramente institucional, ou seja, somente o produto aparecendo em um fundo liso (muitas vezes branco), raramente atrai identificação do público. As pessoas, em geral, necessitam ver como aquele produto pode ser usado em suas rotinas. Imaginem uma marca de temperos, por exemplo, vendendo seus produtos com fotos puramente institucionais, ou seja, mostrando somente os seus produtos dentro da embalagem. Agora, imaginem essa mesma marca de temperos criando anúncios onde ela mostra como esses temperos podem ser usados. Nestes anúncios, ela cria situações em que despertam o interesse do público, como por exemplo, uma mesa de almoço com uma comida bastante apetitosa, servida com um bom vinho. Além disso, a marca ainda pode fornecer a receita daquele prato, obviamente utilizando o seu tempero, como muitas já estão fazendo no mercado.
Quando falo sobre imortalizar o que comemos através da fotografia, quero dizer sobre o poder da comida em si e o que ela provoca. Falo sobre o registro de sentimentos para apreciação agora e para sempre! Comida é comportamento, é identidade, é história, é desejo, é fantasia, é emoção, é sobrevivência, é viver bem, é emocionar-se, é memória, é encontros, é conforto, é alegria, é cor, é amor!
Por Camila Seraceni, fotógrafa.