O ser humano é um animal que evoluiu até se tornar um exímio caçador e coletor de alimentos na natureza. Evoluiu tanto, na verdade, que já nem precisa mais se esforçar para conseguir comida. As árvores, arbustos e pastagens deram lugar às prateleiras dos supermercados.
Por outro lado, muita coisa segue inalterada desde a pré-história, afinal, o homem continua dependendo da natureza para se alimentar, e o instinto primitivo de usar a visão para selecionar o que comer ainda é o mesmo – seja ao coletar uma fruta no pé ou ao escolher uma embalagem na gôndola.
Antes do paladar e até mesmo do olfato, a visão é o primeiro sentido acionado na hora da escolha. O processo de tomada de decisão começa com a aparência visual da comida. Forma, tamanho e cor são importantes desde que éramos caçadores e coletores, mas ainda hoje desempenham um papel importante.
A cor cria uma expectativa para um sabor específico e pode prever os níveis de calorias e lipídios de um alimento, ajudando na decisão de consumi-lo ou não. Esses fatores são evidências de que a cor de um alimento (e sua embalagem) influencia a escolha alimentar de humanos e não humanos.
Cor e escolha alimentar
Você já pensou em como um pássaro escolhe os frutos que come? Ou como um macaco decide quais plantas pode consumir? Os animais, incluindo os seres humanos, precisam saber o que é comestível e o que pode prejudicá-los ou matá-los.
A cor é um fator importante na detecção e aquisição de alimentos pelos animais. Pode ser usada para identificar a adequação de uma fonte de alimento ou melhorar a eficiência da detecção de alimentos e pode até ser vinculada à escolha de parceiros.
A alimentação de aves que fazem migração de longa distância, como a toutinegra e a felosa-das-figueiras, por exemplo, precisa ser rica em gorduras. Elas fazem a seleção dos frutos pela cor, escolhendo os mais escuros e mais azuis, porque são os mais ricos em lipídios no local onde vivem.
Os primatas não humanos avaliam a qualidade dos alimentos com base no brilho das tonalidades de vermelho e verde, com o vermelho sinalizando maior energia ou maior teor de proteínas em frutas e folhas. Apesar da forte associação entre alimentos e outras modalidades sensoriais, os humanos também estimam características críticas dos alimentos, como conteúdo calórico, a partir da visão.
Cor e comportamento humano
Vários estudos foram feitos para analisar as razões pelas quais os seres humanos selecionam certos alimentos em detrimento de outros. Alguns estudaram a relação entre perfume e percepção do paladar, outros a estética e as cores.
Uma das pesquisas mostrou que as cores dos alimentos induzem à excitação e à percepção do conteúdo calórico. As nuances mais avermelhadas nos frutos e folhas geralmente indicam maior energia ou maior teor de proteínas, e tiveram a preferência das pessoas utilizadas no estudo. Por outro lado, com o brilho verde, o efeito foi contrário.
Ainda segundo o estudo, humanos e primatas dispõem de visão tricromática, que aumenta as diferenças entre as nuances de vermelhos e verdes e induz a confiar na visão para a escolha de alimentos. A pesquisa mostra que os humanos podem ser enganados pelo uso de corantes nas comidas e também por suas embalagens, sendo os tons mais avermelhados os mais atraentes pela crença de que têm um maior teor de energia.
Outro estudo relacionou a cor com a expectativa sensorial e o resultado foi diferente dependendo do país em que foi aplicado. Corantes alimentares vermelhos e azuis foram adicionados a bebidas em Taiwan e no Reino Unido. Em Taiwan, acreditava-se que a bebida vermelha era amora, enquanto no Reino Unido se acreditava ser cereja ou amora. A bebida de cor azul em Taiwan era de menta, enquanto no Reino Unido era de framboesa.
Isso significa que as cores dos alimentos podem ter significados diferentes, o que gera expectativas diferentes em diferentes culturas, e isso leva à conclusão de quão eficaz é fazer pesquisas antes de criar produtos alimentares, políticas alimentares e dietas. Cultura, genética, status do provador, idade, sexo, entre outras coisas, podem modular o impacto psicológico da cor dos alimentos na percepção do sabor, causando uma grande aceitação ou rejeição.
Outra pesquisa usou corante vermelho, verde e amarelo para provar como essas cores influenciam certos gostos básicos. A coloração verde diminuiu a detecção de acidez das pessoas e aumentou a detecção de doçura. A coloração amarela reduziu a acidez e doçura, enquanto a coloração vermelha reduziu o amargor. A detecção de sal não ocorreu – o pesquisador acredita que os alimentos salgados estão associados a alimentos de diversas cores, e não a uma específica. Vários estudos psicofísicos mostraram que a adição de corante alimentar pode fornecer até 10% de doçura percebida.
Tudo isso mostra que a influência da cor na escolha dos alimentos é um fato real para humanos e não humanos na previsão de intoxicação, ingestão de nutrientes, paladar e expectativa sensorial. Perfume e aroma também são importantes, mas se um produtor de alimentos sabe o que seu cliente espera de uma cor, pode usar essas informações para criar produtos, rótulos e embalagens mais eficientes.
Ter o conhecimento de como cada cor afeta pessoas de diferentes origens e regiões ajuda a desenvolver ferramentas de marketing para estimular o gosto e a aceitação do consumidor por produtos alimentícios, e também o que deve ser evitado. Do ponto de vista do consumidor, o mais correto é avaliar os alimentos quando eles entram na boca, para que a cor não tenha nenhuma influência no sabor, mas isso exceto durante a busca por comida em ambiente selvagem, devido ao risco de comer algo venenoso.
Cada indivíduo tem uma percepção diferente das cores, levando em consideração sua cultura e experiência, mas é inegável que a cor é o primeiro aspecto percebido pelo cérebro ao decidir se um alimento deve ou não ser consumido ou se é mais gostoso do que o outro.
*artigo escrito com a colaboração de Rafael Krieger.