A ova da tainha é salgada para desidratar e dar origem à Bottarga
(Imagem: Arquivo Bottarga Gold)
A ova da tainha é muito valorizada nos países banhados pelo Mar Mediterrâneo, onde a tradição da Bottarga existe há aproximadamente 3100 anos a. C., quando os antigos egípcios consumiam ovas de peixe secas. Como o Brasil possui uma das maiores pescarias de tainha do mundo, as empresas de pescado aproveitam a safra anual do peixe e vendem a ova in natura congelada para alguns desses países. Porém, a crise no mercado internacional de 2008 acabou deixando muitas ovas estocadas por aqui, e isso foi o estopim para Cassiano Ricardo Fuck decidir que o Brasil precisava diminuir a venda da matéria prima da Bottarga e começar a produzir seu próprio ‘caviar brasileiro’. “O produto era entregue sem ser valorizado”, explica o administrador da Bottarga Gold.
A pesca industrial da tainha é controlada para manter a reprodução da espécie, mas é a pesca artesanal que fez a atividade ser considerada, no ano passado, patrimônio imaterial catarinense pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC). A tradição existe desde o século 16, quando os índios Tupinambás já praticavam a pesca artesanal da tainha com redes. Hans Staden, alemão prisioneiro dos índios por alguns anos, fez um relato que virou o livro Duas Viagens ao Brasil, onde descreve a prática pesqueira.
Todos os anos, entre maio e julho, as tainhas sobem a Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, rumo às águas mais quentes do litoral catarinense. É quando os vigias da pesca entram em ação para avistar os cardumes que se aproximam. Quem já presenciou como o cerco às tainhas é feito, sabe a alegria que toma conta de toda a comunidade pesqueira, quando homens, mulheres e crianças correm para a praia para ajudar a puxar a rede de pesca que traz o peixe mais esperado do ano, que garante o sustento de muitas famílias.
Cassiano e seu sócio Sérgio Arins, o primeiro com 44 anos de experiência com pescados, e o segundo com 25 anos de conhecimento de ova de peixe, sabem que seu trabalho na Bottarga Gold ajuda a manter viva a tradição da pesca da tainha. Por isso, todos os seus produtos são rastreados para que nenhuma ova venha de pesca irregular. Além disso, o sal utilizado para desidratar as ovas e torná-las Bottarga é selecionado e sem iodo, para garantir que as ovas não escureçam com muita rapidez. Esse processo, feito artesanalmente, dá origem à Bottarga clássica da Bottarga Gold, ideal para ser comida em lâminas, com azeite de oliva e pão italiano.
Por mais que os egípcios antigos já comessem ovas secas, foram os fenícios que propagaram o hábito alimentar da Bottarga ao longo da costa mediterrânea, usando-a como moeda para a troca de mercadorias. Eles utilizavam cera de abelha para que a iguaria durasse mais tempo, o que dava à ela um aroma e sabor excepcionais. A Bottarga Gold se inspirou na civilização fenícia para fazer a sua Bottarga cera, e priorizou um fornecedor local que faz cera de abelha com qualidade diferenciada no mesmo estado que é casa da empresa, Santa Catarina. Mesmo a cera sendo retirada para o consumo, o sabor mais adocicado fica presente no produto ao ser degustado.
O grande desafio de Cassiano e Sérgio é tornar a Bottarga mais conhecida pelo brasileiro, afinal, é uma iguaria milenar, apreciada em todo o mundo e que tem, inclusive, um valor sentimental em Taiwan, onde é dada como presente de casamento por seu simbolismo de união, fecundidade e prosperidade. Há também Bottargas de outros peixes, como atum e merlusa, mas a ova da tainha tem fartura de ovos de uma só vez, e é mais resistente, reduzindo a chance de vazamento. A ova da tainha brasileira, no entanto, é ainda mais apreciada pela riqueza de seu sabor.
A Bottarga Gold é hoje a vida desses dois empresários, que têm orgulho em competir em qualidade com produtores de países que possuem a Bottarga como tradição. A satisfação em ver personalidades do mundo da Gastronomia utilizando o ‘caviar brasileiro’ feito por eles só não é maior do que ver a população brasileira consumindo a Bottarga como parte de uma cadeia que saboreia uma iguaria valorizando a sua história. Para Cassiano, essa satisfação vai um pouco além, pois quer deixar a Bottarga como patrimônio para seus netos dizerem “Foi meu avô que começou”.