Um livro nas mãos da pessoa certa. Foi assim que iniciou a relação da família Volkmann com a Antroposofia. Hoje, na terceira geração em posse do livro de Rudolf Steiner deixado em Porto Alegre em 1910, seu método de conhecimento não é somente aplicado nas plantações da Fazenda Capão Alto das Criúvas, mas passado adiante nas aulas de agricultura biodinâmica ministradas por João Batista Amadeo Volkmann, que almeja uma evolução cultural por meio da agricultura.
O alemão Paul Erdmann Volkmann chegou ao Brasil em 1897 aos 15 anos, e foi floricultor durante toda a vida. Com a dificuldade de locais de hospedagem à época na capital gaúcha, hospedou, em 1910, um violinista em sua casa. Este, como agradecimento, deixou o livro do pai da Antroposofia, que em grego significa ‘conhecimento do ser humano’, no qual o austríaco Steiner descrevia sua metodologia de conhecimento da natureza do ser humano e do universo, ampliando o método convencional para todas as áreas da vida humana em seus diversos níveis – físico, vital e espiritual.
João, neto de Paul e oitavo filho de Edgar Volkmann, já aos 6 anos de idade dizia que queria ser agrônomo. Seu pai, funcionário do Banco do Brasil, tinha uma grande ligação com a agricultura e a música, e comprou, em 1954, uma fazenda na atual cidade de Sentinela do Sul, a 100 quilômetros de Porto Alegre, e lá começou a praticar aquilo em que acreditava: proteger a natureza. Ao invés de fazer queimadas como os outros fazendeiros daquele período, plantava árvores. Sua sabedoria, ligada à composição da paisagem da agricultura biodinâmica com base na Antroposofia, era considerada ignorância pelos vizinhos, e durante 20 anos sua fazenda foi saqueada, até que se cansou e arrendou suas terras.
Naquele tempo, aos 14 anos, João ficou muito triste com o arrendamento da fazenda, mas encontrou uma luz nos movimentos da Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural), liderada por José Lutzenberger, nos quais começou a participar. Em meio à ditadura em que vivia o Brasil, a defesa das ideias ambientalistas de Lutzenberger eram vistas como subversivas, e as reuniões eram escondidas para que o Serviço Nacional de Informações, o principal órgão de espionagem da ditadura, não as descobrisse.
João Volkmann continuou firme em seu desejo de ser agrônomo, e assim o fez. Estudou Agronomia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, onde, mais uma vez, teve contato com Lutzenberger, dessa vez como professor. Em 1983, ao se formar, João assumiu a fazenda da família e iniciou o trabalho de recuperação da mesma, pois durante os nove anos em que o local esteve arrendado, foram usados agrotóxicos, os quais precisavam ser eliminados para que ele conseguisse trabalhar com a agricultura biodinâmica.
“Durante três anos sofri muito com a contaminação da área, fui permitindo uma regeneração lenta, que era acelerada com os preparados biodinâmicos”, explica João. No modelo agrícola biodinâmico não são utilizados adubos químicos, venenos herbicidas, sementes transgênicas, antibióticos ou hormônios, mas ‘adubos’ naturais feitos a partir de esterco, plantas medicinais e silício. Esses adubos são enterrados no solo para sofrerem as influências da Terra, uma vez que a agricultura biodinâmica tem uma forte relação com as fases da lua e signos do zodíaco.
Nos dias de hoje, quase 37 anos depois que João voltou à propriedade comprada por seu pai, a Fazenda Capão Alto das Criúvas abriga, além das plantações do famoso arroz biodinâmico Volkmann, uma enorme variedade de répteis, anfíbios, peixes e pássaros. No local, foram encontradas 244 espécies de pássaros migratórios do Canadá e da Patagônia, o que foi considerada a maior diversidade de pássaros do mundo pela Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul.
João Volkmann não é apenas um exemplo de como a agricultura biodinâmica é benéfica ao meio ambiente, à saúde das pessoas e à do planeta. João segue a linha de que não se faz agricultura somente para comer, mas também para que as pessoas que trabalham a terra sejam vistas como parte integrante da sociedade. Por isso, leva seu conhecimento adiante em aulas que iniciaram em 1991 na Fundação Gaia, e que hoje, em sua fazenda, fazem parte de seu projeto de formação de agricultores que não usam veneno, trabalham com amor, bondade, e estão promovendo uma revolução cultural para criar uma mudança na agricultura até chegar ao ponto de a sociedade não querer mais comer alimentos com veneno.
Para o futuro, João gostaria que a fazenda perdurasse 400, 500 anos, pois acha imprescindível tirar o egoísmo de cima do projeto, e assim contribuir para a evolução cultural da humanidade por meio da agricultura e da arte, tão necessária para a compreensão da agricultura biodinâmica. Por mais que seus grãos de arroz curto, longo, vermelho e negro tenham ganhado o mundo, o responsável pela Volkmann Alimentos acredita que seu carro-chefe não seja o arroz: “Meu principal produto é a mata nativa, o equilíbrio da paisagem para uma produção estável”.